Sobre Maria Felipa

 

    Este grupo nasceu da vontade de um grupo de mulheres capoeiristas de conversarem sobre suas questões de pesquisa acadêmica, suas aflições enquanto mulheres dentro do universo masculino da capoeira, seu ativismo feminista dentro e fora da pequena roda, enfim, suas lutas, seus pesares e suas conquistas. Este grupo tem o propósito de fortalecimento mútuo, ele não é somente um grupo de estudos do tipo acadêmico, tampouco é um coletivo de ativismo político pontual. Estamos interessadas em explorar nossas feridas, conversar sobre o que nos dói e ajudarmos umas às outras a encontrar nossas forças, seja dando voz e coro às nossas inquietações intelectuais e de educadoras ou seja emprestando nossa força física e emocional para realizar ações e intervenções contra o machismo e a opressão de gênero da sociedade patriarcal em geral. O principal exemplo de intervenção que realizamos são as Rodas Feministas de Capoeira, lideradas por mulheres cantadoras, tocadoras e jogadoras de diferentes correntes e vertentes da capoeira, da angola à regional, e abertas para todos que queiram gingar em uma roda regida por mulheres.

    Não à toa escolhemos a figura histórica de Maria Felipa para nomear nosso grupo. Consideramos que a tradição machista e sexista da capoeira não oferece representações que contemplem as mulheres, portanto nos conectamos com a figura de Maria Felipa como nossas ancestral na Capoeira, representando assim a tradição das mulheres dentro deste universo. Como ela, existem muitas outras, mulheres capoeiristas esquecidas nas dobras da história e até hoje subalternizadas, mestras e ancestrais que precisam ser relembradas e valorizadas. São nossas verdadeiras referências e seus exemplos fortalecerão a atual luta das mulheres, dentro e fora da capoeira, para que as capoeiristas de hoje possam sentir-se firmes e representadas dentro da história da sua arte.

    Para melhor contar a história desta grande mulher utilizaremos as palavras de Frede Abreu em seu livro “Capoeiras: Bahia, século XIX: imaginário e documentação” V.1 Instituto Jair Moura, 2005.

“Notícias de Maria Felipa

Em 10 de julho de 1822, a ilha de Itaparica, localizada no Recôncavo baiano, foi assaltada pelas tropas portugueses, comandada por Madeira de Mello. O assalto foi rechaçado pelos homens e mulheres moradores da ilha. Entre elas, destacou-se pela valentia, a negra Maria Felipa de Oliveira. Este episódio, como outros da Independência da Bahia, se fixou no imaginário popular com visgos de lenda e de História. A memória de Maria Felipa está sendo alvo de pesquisa levada a efeito pelo Centro de Pós-Graduação das Faculdades Olga Mettig, em Salvador/Bahia, coordenada pela professora Eny Cleide /Vasconcelos Faria. Na reconstrução da memória de Maria Felipa, uma das hipóteses levantada e a sua condição de capoeirista.

Parece-me que ao se levantar esta hipótese considerou-se três aspectos relacionados com a capoeira: a possibilidade da presença dela na Bahia em 1822; a tradição guerreira que lhe é computada pelo imaginário popular; mulheres valentes tomadas como capoeirstas. A seguir reproduzo trecho de matéria jornalística sobre Maria Felipa, retirado do Correio Repórter, suplemento dominical do jornal Correio da Bahia do dia 20/2/2005, assinado pela jornalista Andreia Santana.

Espiã capoeirista

Não e através dos dois teóricos estrangeiros [Peter Burke e Haldene], ou mesmo via os raros textos que citam Maria Felipa que se fica sabendo, por exemplo, que a guerreira de Itaparica era uma exímia capoeirista. informações como essas. pitorescas, só existem no folclore popular, que de tanto ser repetido, século após século, torna-se verdade absoluta e inquestionável. Pois Maria Felipa de Oliveira não só era capoeirista, como remava sua canoa de Itaparica até o Mercado Modelo, onde desembarcava para jogar o brinquedo de Angola com os lutadores de Salvador.”